A evolução tecnológica facilitou a criação de sociedades vigiadas. Começou com o ataque em 2001 às torres do World Trade Center em Nova Iorque (EUA), prosseguiu com diferentes intervenções de ataques sistemáticos a civis, juntou-se uma crise financeira que acatou a desproporção entre ricos e pobres, e prosseguiu com as pandemias climática e da Covid-19. E, claro, eventos que deviam solidarizar a humanidade avançaram em sentido contrário.
As dinâmicas impostas pelas tecnologias – com impactos futuros desconhecidos, como a sucede com a inteligência artificial (IA) ou a bio-engenharia – abanaram os pilares políticos das sociedades. Sem perceber que o século XXI impõe uma dinâmica acelerada para um natural desconhecido que as estruturas ossificadas do presente não conseguem acolher, a sociedade do risco constante é naturalmente assustadora para a gestão política.
Do lado social, a vigilância banalizou-se, com o argumento dos incontáveis benefícios. Atenuou-se a privacidade, esse mal ainda necessário para a evolução tecnológica. E a população fascinou-se sem compreender o real impacto das decisões que os vendedores atenuam.
A globalização teve consequências impossíveis de antecipar nas áreas económicas e culturais, políticas e sociais. A mudança dos pólos geopolíticos mundiais gerou intranquilidade. O mesmo sucedeu a nível interno nos EUA com uma classe política apanhada desprevenida pela velocidade de Silicon Valley. A China, a Rússia ou a Índia não ficaram paradas e África também não, mas o fosso entre forças tecnológicas, políticas e sociais complexificou-se para diminuir a protecção de direitos humanos e cívicos. A militarização das sociedades com as tecnologias duais é um facto.
O reconhecimento facial para a vigilância é um exemplo, eficaz na aceleração dos controlos necessários, mas também usado para perseguir activistas ou opositores. É usado para desbloquear smartphones ou para evitar roubos em lojas, para perceber a movimentação de clientes e optimizar os espaços comerciais ou até para fornecer informação personalizada de voos em aeroportos.
Mas, “tal como a energia nuclear e as armas biológicas, o reconhecimento facial representa uma ameaça à sociedade humana e às nossas liberdades básicas que supera em muito quaisquer benefícios potenciais”, diz Leila Nashashibi, da organização Fight for the Future.
“é diferente de qualquer outra forma de vigilância porque permite a monitorização automatizada e omnipresente de populações inteiras, e pode ser quase impossível de evitar. À medida que se espalha, as pessoas terão muito medo de participar em movimentos sociais e manifestações políticas. A liberdade de expressão vai diminuir”.
Por – Pedro Fonseca