CIÊNCIA & TECNOLOGIA
Quem Financia a Inovação em África?
A propósito do lançamento, em finais de Janeiro último, do Estudo Sobre o Enquadramento Legal do Capital de Risco em Moçambique, levado a cabo pelo FSDMoç (Financial Sector Deepening Moçambique), é importante começar uma discussão mais aberta sobre o financiamento da inovação em África e, em particular, em Moçambique.
África tem assistido a um crescimento imenso em inovação tecnológica nos últimos anos.
Moçambique, em particular, possui um rico ecossistema com iniciativas focadas em tecnologia e inovação, (incluindo competições como o Seedstars e o Slush Global Impact Accelerator ); espaços de inovação e apoio a empreendedores (como a ideiaLab, a Incubadora de Negócios do Standard Bank e o espaço Orange Corners da Embaixada do Reino dos Países Baixos); iniciativas orientadas para a educação tecnológica (como a Mozdevz, Muthiana Code e Africa Code Week ) e até um envolvimento directo do governo, com a criação do Parque da Ciência e Tecnologia de Maluana pelo Ministério de Ciências e Tecnologia.
Mas, por mais que o ecossistema aparente estar activo e ser dinâmico, a realidade da indústria inovadora é que muitas destas iniciativas terminam no estágio inicial de ideação ou, na melhor das hipóteses, do produto mínimo viável, sendo vistas apenas de raspão como título de notícia ou em competições de startups.
Para que haja um crescimento destas iniciativas, e para que Moçambique comece a se engajar activamente com as comunidades de inovação no continente e a nível global, é preciso que haja sistemas financeiros de suporte a estas iniciativas, que estejam não só alinhados com a direção global dos investimentos em inovação mas tenham também uma boa percepção das realidades e necessidades locais.
Em ecossistemas mais maduros como São Francisco, Nova Iorque ou Londres, para além das estruturas tradicionais de suporte a empreendimentos inovadores – como, entre outros, crédito bancário e pequenos fundos de negócio – existem redes de investidores já formadas e focalizadas nos variados estágios de desenvolvimento de uma ideia: desde grupos focados somente na fase de “semente” (onde a ideia está ainda em formulação), a outros dedicados à fase de prova do conceito (onde é criado um protótipo ou produto mínimo viável), havendo depois aqueles que estão orientados para a fase de crescimento (onde a ideia procura estabelecer-se no mercado) até, por fim, àqueles que estão especificamente orientados para as fases de expansão (onde a ideia é introduzida noutros mercados).
De acordo com o relatório apresentado pela FSDMoç, em Moçambique, “o tecido empresarial é constituído maioritariamente por Pequenas e Médias Empresas (PMEs), que enfrentam vários constrangimentos, nomeadamente acesso ao crédito e aos mercados, ausência de conhecimentos de gestão empresarial e falta de capacidade produtiva. Outras fragilidades das PMEs dizem respeito à falta de qualidade internacionalmente exigida nos produtos, ausência de mão-de-obra qualificada e baixa produtividade, entre outros. Neste âmbito, o capital de risco surge como uma alternativa de financiamento à economia.”
Moçambique apenas recentemente registou a criação da Mozambique Business Angels Association, uma sociedade de investidores focada em apoiar financeiramente iniciativas locais, presidida por Sara Fakir, co-fundadora da ideiaLab.
Mas sociedades como esta ainda são poucas e para que se possa contribuír activamente para o desenvolvimento do sector de inovação tecnológica em Moçambique é necessário que surjam iniciativas suficientes para apoiar a inovação não só na capital mas em todo o país.
“Embora o quadro legal desta indústria exista há quase 20 anos, até à data, foram registadas apenas duas sociedades gestoras de Fundos de Capital de Risco. Este cenário reflecte a inexistência de um ecossistema de suporte, bem como a inadequação do seu regime regulamentar. Reformas nos domínios fiscal, regulamentar e de políticas económicas, acompanhadas de uma forte capacitação dos principais intervenientes, podem favorecer a dinamização deste segmento”, diz ainda o relatório.
No que diz respeito à procura de investimento externo, encontramos, com frequência, investidores com pouco conhecimento da realidade local e que estão à procura de inovações do tipo que são desenvolvidas em Silicon Valley, nos EUA e que, de forma geral, não respondem aos problemas mais pertinentes do continente. Daí a importância do estabelecimento de fundos de investimento locais, tanto a nível do país como do continente.
“A esperança é que fundos [de investimento] focados em África, liderados por africanos, possam melhor atrair e apoiar fundadores por causa da sua familiaridade com os mercados locais onde estas startups operam. Para os fundadores, apresentar-se a investidores de Silicon Valley, que não percebem as nuances dos mercados africanos locais muitas vezes mostra-se complicado”, diz Mohini Ufeli no seu artigo para a Quartz, ao comentar o financiamento da startup nigeriana Andela em 40 milhões de dólares, financiamento este liderado por um fundo de investimento Africano.
Felizmente, com o inicio de debates sobre como podemos, enquanto colectivo, apoiar as inovações tecnológicas e pôr Moçambique a participar mais activamente com a comunidade global, começamos a assistir a uma maior dinamização do sector de inovação tecnológica. É que é fundamental estimular o aparecimento de investidores não só mais maduros e experientes, mas também conectados com a realidade e as necessidades locais.