A democracia globalmente tem enfrentado crises. Em África ou no Sul global a situação agrava-se por se registar conflitos pós-eleitorais, guerras ou golpes de estado. Moderada por Fidélia Chemane, especialista em governação e direitos das mulheres, o painel com tema “Corpo Social: democracias em reinvenção” debateu as democracias contemporâneas, reflectidas também para o futuro, tendo como foco principal nas novas dinâmicas políticas e na participação cidadã em tempos de transformação.
João Feijó, investigador e especialista em estudos africanos, apresentou dados a ter em conta na análise sociopolítica em Moçambique, entre eles, o crescimento populacional, a taxa de desemprego e da fome, bem como se a baixa qualidade do ensino que diminui a qualidade do debate em assuntos democráticos.
Avançou que “a população pouco ou nada sabe sobre o que é socialismo, social democracia, comunismo, isto dificulta a capacidade dos políticos conceberem projectos políticos maduros. Basicamente as promessas políticas são Shopping Lists (vamos dar enerrgia, água, escola), não se explica qual é a doutrina económica que se vai seguir”, como as grandes questões estruturais da economia, a centralização e descentralização, diversificação da economia, taxas de natalidade e a educação, são tidos em conta nas promessas eleitorais.
Annick Adopo, investigadora de ciências jurídicas e políticas costa-marfinense, apontou que o processo de reinvenção das democracias começa com o povo na gestão da própria democracia. E face à violência e os conflitos pós-eleitorais que se verificam mundialmente, advoga pertinente a insercção de um quadro de formação dos membros dos partidos políticos.
“Ensinar a eventualidade de perder. É um jogo. Perdemos ou ganhamos, mas se não conseguirmos preparar os nossos membros para as perdas, não vai correr bem” disse Adopo, finalizando que “a formação do cidadão, a educação à cidadania, talvez é isto que vai permitir reinventar a democracia no cenário africano”.
Há vozes que são silenciadas. Marie Boka cientista política e especialista em relações internacionais da Costa de Marfim, dá exemplos de jovens e mulheres, que muitas vezes são oferecidos espaços de diálogos limitados e específicos e, por esta razão, diz, “para habitarmos todos juntos na terra, é preciso que na tomada de decisão todos tenhamos participação. É preciso ter uma educação que permita entender a realidade do país e exprimir-mo-nos com sabedoria”.
Kamina Diallo, especialista em segurança e género, trouxe à Conferência a sua pesquisa sobre o processo de desmobilização, desarmamento e reintegração (DDR) das mulheres envolvidas na guerra civil na Costa de Marfim, ocorrida entre 2002 e 2011. E porque Moçambique tem uma situação semelhante de desarmamento e reintegração dos guerrilheiros da Renamo, a sua intervenção não deixou de chamar atenção, mais ainda quando a abordagem é sobre como foram tratadas as mulheres.
“Parte da despolitização das mulheres ex-combatentes é a suposição de gênero de que as mulheres, diferentemente dos homens, não precisam forjar um novo papel pós-conflito na sociedade; elas podem retornar ao seu trabalho em casa. Mas nem todas as mulheres marfinenses conseguiram se reintegrar facilmente porque seu status de ex-combatentes carregava um estigma para algumas, prejudicando as relações com suas famílias, amigos e comunidades”, disse Diallo.
Por Felizarda Nhare